sábado, 27 de fevereiro de 2016

ERA UMA VEZ




Arpad Szenes, A Alcova, 1935






do amor que por definição é arco-íris


Era uma vez um príncipe.
Príncipe ou princesa são, aqui, meros facilitadores de linguagem de quem, aliás, não se tem em má conta.
Há muitos e muitos anos atrás, esse príncipe, divorciado e que tinha um filho de um recuado casamento a quem muito amava, um belo dia apaixonou-se por outro homem que lhe correspondeu durante algum tempo mas apenas e só por algum tempo até que as coisas se deterioraram.
Para esta estória interessa apenas saber que o príncipe entendia ser o amor para a vida e o outro homem não, que as coisas tinham chegado ao seu términus.
O príncipe, inconformado mas por entender que da opção por si feita, com pesados custos, dando-a como exemplo e até porque só assim o seu amor diferente se poderia emancipar e não ser coisa leviana ou ganhar fóruns de soberania, de cidadania, da polis e, logo, da Política ou coisa pública, dando-a como exemplo, escrevia, a deveria legar a seu filho como não tendo sido em vão e lançou-se, então, numa batalha na reconquista do amor perdido utilizando, apenas, os mais lídimos meios ao seu dispor.

Uma batalha limpa.
Limpa, isto é, sem recurso, por uma vez que fosse, a qualquer tipo de violência ou coação física ou psicológica para grande espanto dos seus circundantes e nessa batalha não hesitou em recorrer ao poder supremo do reino e arredores, reino, aqui, também em sentido figurado pois que se tratava como trata de uma república tal como arredores sugere uma alegoria para o mundo e fazendo uso de todas as armas limpas, repito, legítimas de que dispunha.
À sua volta, como já disse, à volta do príncipe, instalou-se, então, a máxima das perplexidades que o príncipe não mais se cansou de contrariar sem fechar nenhuma porta, perplexidade que o remeteu para a travessia de um árido deserto qual exílio que, não apenas não o desmobilizou como, aos poucos e com o tempo, se foi, progressiva ainda que timidamente dissipando.

Entretanto só o palácio da princesa lhe abriu, de par em par, as suas portas.
E o príncipe contou-lhe, anos a fio a sua história, inquietações e angústias de tal modo que perante a imensa disponibilidade, generosidade, amor da princesa, esta acabou por conquistar, profunda e irreversivelmente, o seu coração.
O príncipe que havia perdido, há muito, o seu dom maior, o dom do canto que desenvolvera qual cigarra em eterna primavera, recuperou-o convertido na escrita e nunca mais parou de o exercitar em registo público que se desenvolveu e foi pelo canto escrito que ergueu a sua obra como o continua a fazer, aquela de um amor arco-íris e não a preto e branco como só assim o amor é digno desse nome e de que todos e sem exceções são credores desde que nele se empenhem sem desfalecer e no respeito mútuo como, também, só assim o amor, verdadeiramente, o é, obra essa que derramando-se sem mais parar em todas as direções e dimensões, até aqui já me conduziu.

Esse príncipe sou eu e assim, há anos e anos a fio, não paro de dar cartas tal como o amor que na fidelidade e constância, simples pleonasmos, se realiza, repercute e desenvolve ad aeternum.
Princesa e príncipe foram felizes como o continuam a ser, determinados também e, oxalá, para sempre.





no que ao amor diz respeito tudo o mais não passa de lugares comuns e se, é certo, ninguém está obrigado a expô-lo, não menos certo é que nada impede de o fazer, muito antes pelo contrário, antes desnudando-se se pode afirmar com toda a diferença








Jaime Latino Ferreira
Estoril, 27 de Fevereiro de 2016




1 comentário:

manuela baptista disse...

a estória, da história da História!